Reconhecimento de uma carreira de meio século
O treinador Artur Lima, de 75 anos, foi homenageado pelo Paço Arcos Clube (PAC), numa cerimónia que decorreu durante a Final Four do Campeonato Distrital de sub-16 feminino e que contou com a presença, para além das quatro equipas finalistas – Quinta dos Lombos (que se sagrou campeã), Sporting, SIMECQ e Paço de Arcos Clube – do presidente do PAC, Francisco Martins, do vereador do desporto da Câmara de Oeiras, Pedro Patacho e do presidente da Associação de Basquetebol de Lisboa, Rogério Mota, que fizeram o elogio público do técnico.
Uma homenagem que assinalou meio século de carreira foi, decerto, um momento especial?
Artur Lima (AL): Para mim o significativo foi o clube, onde tenho prestado alguma colaboração nestas três épocas, querer fazer esta homenagem. Não foram propriamente as grandes instituições do basquetebol português, mas sim este pequeno clube. Isso para mim foi extremamente significativo.
Nasceu em Lisboa, mas aos 8 anos rumou para Moçambique onde viveu até aos 22 anos. Moçambique que foi berço de alguns dos nomes mais famosos do basquetebol português, como Hermínio Barreto, Mário Albuquerque, Nélson Serra, Rui Pinheiro ou Carlos Lisboa. Como surgiu o basquetebol na sua vida?
AL: O meu pai sempre foi um amante do desporto, mas nunca teve a possibilidade de praticar, então procurou que o filho praticasse desporto desde novo. Comecei aos nove anos em Lisboa, na ginástica do Benfica, com o professor Paulo Gouveia. Quando fui para Moçambique, em 1957, cheguei à Beira, onde vivia um grande entusiasta do basquetebol, Afonso Domingues. Não havia minibasquete e jogávamos com tabelas normais e bolas grandes nº7. Foi assim que comecei a jogar com nove anos e acabei por me inscrever no Ferroviário da Beira.
E como treinador?
AL: Quando fomos para Lourenço Marques, atual Maputo, fui estudar para a Universidade da Associação Académica de Moçambique e aí iniciámos os treinos da formação. Foram os meus primeiros passos como treinador-adjunto de Adriano Baganha.
De regresso a Portugal deu início a uma longa caminhada de meio-século, que o levou a trabalhar por muitos clubes, pela Federação Portuguesa de Basquetebol até chegar ao Paço de Arcos Clube. Foi um longo percurso. Como viveu o basquetebol em Portugal nestes 50 anos?
AL: Em finais dos anos 70 vim para Portugal e com o bichinho que trazia de Moçambique comecei logo a treinar uma equipa. Primeiro, com a equipa feminina universitária do Técnico e, depois, com o minibasquete do Algés. Mais tarde passei pela equipa sénior do Técnico e estive presente no primeiro curso oficial de treinadores em 1974, onde estiveram entre outros, o atual presidente da FPB, Manuel Fernandes, o antigo selecionador nacional, Alfredo Almeida, num curso cujo diretor-técnico foi o professor Teotónio Lima.
Seguiram-se passagens pelo Colégio João de Brito, Sporting, Federação Portuguesa de Basquetebol, onde fui selecionador nacional de Su-20 e Sub-22 (integrado no CAR Jamor) e ainda dei uma colaboração no Queluz. Saí da Federação em 2007 e daí até agora apenas ajudei esporadicamente o meu filho João Miguel, que foi jogador e treinador no Queluz e depois no Sporting. Tenho estado afastado, desde então, porque nasceu outro filho e a minha mulher (Samira Barrina) como era árbitro
internacional estava muitas vezes fora e tomei a decisão de me afastar para dar assistência à família. Nunca mais me liguei a nenhum clube ou Federação.
Então como e quando aparece o Paço de Arcos Clube?
AL: Entretanto houve conversas com o Francisco Martins, que é o presidente do clube, no sentido de poder dar uma ajuda. Tinha passado o período da pandemia, eu também apanhei a Covid e, depois de estar tanto tempo em casa pensei, que tinha chegado a altura para fazer o que gosto. Quando o Francisco me convidou, acabei por aceitar. Foi em 2021.
O PAC é um clube com características especiais. É baseado no voluntarismo, encabeçado por Francisco Martins, que conseguiu agregar muitas pessoas, nomeadamente pais. A Direção é composta por pessoas que têm os seus filhos a jogar. Quando me propus aceitar o convite tive o cuidado de frisar que, principalmente, iria trabalhar com os treinadores dos escalões de Sub-14 e Sub-16.
Entretanto o PAC já conquistou o primeiro título e logo nos Sub-14.
AL: O título em sub-14 é sempre interessante. Constitui a primeira etapa na vida de um jogador. Foram miúdos que começaram aqui no minibasquete e que formaram a equipa nacional de sub-14 de mais valia. Mas foi essencialmente fruto do trabalho do treinador Alexandre Correia – e do seu adjunto, Jorge Afonso -, que já conhecia da Federação, no trabalho das seleções nacionais. É bom referir que este ano, todas as equipas da categoria de formação, dos sub-14 aos sub-18 (masculinos e femininos) estão nas Final Four, o que é bem revelador do trabalho que é feito no Paço de Arcos Clube, mesmo que não se ganhe qualquer título nacional.
Mário Palma disse uma vez ao Record (1/02/2014) que, ‘na formação não se está a trabalhar com o objetivo de formar jogadores, mas sim para ganhar jogos e promoções pessoais’. Concorda com esta análise?
AL: Não tenho espírito de Velho do Restelo. Nunca achei que antes é que era bom e agora é tudo mau. Houve coisas boas anteriormente e agora há coisas muito boas. Atualmente, as pessoas que andam há volta do basquetebol, pelo menos aquelas com quem eu lido mais, têm uma formação mais completa. Pelos cursos de treinadores que têm, pelos estágios que são obrigados a frequentar e até pela vivência dos jogos, a generalidade dos treinadores estão bem preparados. Agora dizer que querem ganhar títulos isso é insofismável e não é típico de Portugal. Só lamento que no minibasquete não se tenha adaptado a competição, como existe em Espanha, há vários anos, com os miúdos de sub-14 e sub-16 a surgirem muito bem preparados na competição, com os resultados que se conhecem a nível europeu.
A trabalhar essencialmente no campo da formação, como vê o futuro do basquetebol em Portugal?
AL: Entrei na Federação em 1992 e saí ao fim de 16 épocas. Acompanhei muito o basquetebol nacional e europeu. As Seleções Nacionais, nos anos 80 e 90, ao nível da formação, em comparação com as outras, eram muito inferiores. Hoje se não se nota uma melhoria em termos técnicos, mas fisicamente os nossos jogadores são comparáveis aos jogadores de outras seleções. Em termos de treino tomou-se uma maior atenção à parte física. O que se passa neste clube é significativo, com trabalho de preparação física para todas as equipas, duas e três vezes por semana fora do pavilhão.
E como vê o futuro do Paço de Arcos Clube?
AL: Não tenho espírito de profeta. Este é um grupo de família. Tenho manifestado algum receio ao presidente Francisco Martins, mas ele como principal responsável tem estado a libertar outras tarefas para pessoas que estão no clube e que têm grandes capacidades a vários níveis, como a informação e comunicação, preparação física, para além do jogo em si. Depois há uma bandeira neste clube que é o Torneio Internacional. Já se realizaram duas edições (2022 e 2023), em dois fins-de-semana, com cerca de uma centena de jogos de todas as categorias, dos minis aos seniores e já com uma participação significativa ao nível internacional e isso só é possível porque há muitas pessoas integradas no clube. Reconheço que não é fácil dizer que, daqui a 10 anos, está melhor que hoje. Era bom que estivesse Para isso teria de ter mais apoios de vária ordem, melhores instalações, financeiras, de modo a levar o Paço de Arcos Clube para outro patamar.
E para o Artur Lima quais são os seus seus objetivos futuros ?
AL: Tenho tido as minhas maleitas, mas espero dar a minha colaboração por mais tempo. Mas tenho a certeza que haverá muito mais gente a aparecer, mesmo outros que tenham feito uma paragem voltem a colaborar connosco, nomeadamente na área técnica.
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